O desaparecimento dos insetos: uma catástrofe silenciosa

O desaparecimento dos insetos tem ocorrido a um ritmo acelerado. Estes seres desempenham funções muito importantes na natureza, mas “são pouco respeitados”. O desaparecimento dos insetos, causado, em grande parte, pela ação humana, é um problema que se tem vindo a acelerar ao longo das últimas décadas. Estudos alertam que se não houver mudanças, irão surgir consequências graves.

Há alguns anos, ao fazer uma longa viagem de carro, era normal, no final, ter o pára-brisas repleto de insetos esborrachados. Mas, e agora, o que se está a passar? Este é o chamado “Fenómeno Para-brisas” e é uma forma empírica de se constatar que existe uma diminuição dos números de insetos, algo que, segundo José Manuel Grosso Silva,  curador de entomologia do Museu de História Natural e da Ciência da Universidade do Porto (MHNC-UP), “pode ter sérias consequências, já que os insetos desempenham um papel fundamental no equilíbrio dos ecossistemas terrestres”. O Homem volta a ser responsabilizado por esta catástrofe silenciosa e José Silva confessa que não tem muita esperança na reversão e melhoria do problema, mas acredita que seja possível, com muito esforço, estabilizar os números das populações de insetos. Para o entomologista “a destruição de habitats, o aumento de áreas urbanizadas, a introdução de espécies exóticas, o uso de inseticidas, a poluição luminosa e o aquecimento global são os principais fatores contribuidores para a redução dos insetos”. De acordo com um estudo publicado no jornal “PLOS ONE” em 2017, mais de 75% da biomassa de insetos voadores tinha sido extinta desde 1990 até essa data. Dados do portal “Our World in Data”, indicam que o uso de inseticidas a nível global, chegava, em 1990, a quase 600.000 toneladas. Em 2019, chegava a quase 700.000 toneladas. José Manuel Grosso Silva refere que “o problema do uso de inseticidas prende-se com o facto de serem utilizados, principalmente, em explorações agrícolas, ou seja, em áreas muito grandes e em enorme escala”, e há uma grave consequência. “dos inseticidas utilizados ao longo das últimas décadas ainda continuam a atuar.” O problema não afeta só com insetos, mas também outros grupos, como a fauna aquática, pois a chuva “arrasta” os inseticidas para cursos de água. Aves e certos mamíferos também são afetados pelo desaparecimento de insetos, pois muitas das espécies, especialmente quando são mais novas, alimentam-se de insetos.

É certo que grande parte dos insetos não são desejados, sendo classificados, pela maioria, como perturbadores e até nocivos para a saúde. Mas, de mais de um milhão de espécies conhecidas a nível mundial, apenas “umas centenas podem ser perigosas para a saúde”. José Silva revela que na realidade têm um papel estruturante, “os insetos são muito conhecidos pelo papel importante que desempenham na polinização, já que mais de 75% das plantas que consumimos são polinizadas por eles. Se não fossem eles, não haveria certos frutos, não haveria produção de certas sementes, portanto, teríamos problemas para abastecer a população…”, refere ainda que “também teríamos muito menos alimentos de origem animal”. De acordo com a Organização das Nações Unidas para a alimentação e agricultura (FAO), cerca de 75% das culturas agrícolas mundiais e quase 90% de todas as plantas selvagens dependem, em parte, da polinização. Mas, de 1,05 milhões de espécies, que desempenham um papel relevante neste processo, cerca de 40% estão a diminuir, e ⅓ estão em perigo. 

Nem todas as espécies de insetos participam na polinização. Cientistas estimam que, de todas as espécies animais na Terra, mais de 200.000 tenham impacto direto neste processo, sendo mais conhecidas as abelhas e, sendo a maioria insetos. Estes seres têm também um grande impacto económico, já que biliões de euros em bens alimentares dependem da sua ação anualmente.

Atividade de observação de insetos noturnos orientado por José Manuel Grosso Silva // Fotografia: Gustavo Santos

Vários estudos apontam para o combate às alterações climáticas como uma das ações mais importantes a tomar para ajudar a reverter o problema, assim como a criação de mais espaços verdes em áreas urbanas e a aplicação de medidas que visem prevenir a introdução de espécies exóticas e a destruição de habitats. Outra das soluções para o problema pode passar pela ação das câmaras municipais, juntas de freguesia ou dos proprietários de parcelas de terreno, ao não cortar e limpar os espaços verdes como o fazem atualmente. Para o entomologista, “é importante que as pessoas possam usufruir de jardins, mas não do espaço todo, podendo deixar espaço para proteger os insetos.” Outra solução poderá ser maior restrição ao acesso e uso de inseticidas por pessoas não habilitadas, bem como maior sensibilização para a importância dos insetos para os ecossistemas. O entomologista refere que o seu interesse pelos insetos começou na altura em que iniciou, na escola, a disciplina de Ciências Naturais, algo que evidencia a importância da educação no combate ao declínio dos insetos.