“O conhecimento é absolutamente decisivo para a mudança…” – Entrevista a Luísa Schmidt

É socióloga e investigadora principal no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. É pioneira pelo facto de ter sido membro da equipa introdutora da Sociologia do Ambiente em Portugal. Luísa Schmidt, que foi parte integrante do painel que no primeiro dia do Seminário Nacional Eco-Escolas 2019 discutiu as alterações climáticas, fala-nos, entre outras coisas, daquele que deve ser o papel da instituição escola na formação de um jovem

No decorrer da sua intervenção enquanto oradora, Luísa Schmidt destacou a importância da articulação entre medidas escolares e as que estimulem os jovens no período extracurricular.
Foto de: Catarina Oliveira

Bem-vinda ao Seminário Nacional Eco-Escolas 2019! A Luísa é pioneira na introdução da Sociologia Ambiental em Portugal. Há 20/30 anos atrás quando essa vertente da Sociologia foi introduzida no nosso país, esta não tinha qualquer tipo de relevância no panorama social da época. Hoje, estamos em condições de afirmar que esta vertente da Sociologia está de “boa saúde”, e tem, efetivamente, uma voz ativa na sociedade?

Sim. Foi, de facto um percurso muito interessante que começou noutros países Europeus e até na América, mas nós como chegámos mais tarde às questões ambientais, fomos um país que não teve uma Revolução Industrial, que chegou à sociedade de consumo muito tarde, as externalidades ambientais também chegaram mais tarde, e, portanto, os problemas ambientais começaram a fazer-se sentir apenas nos anos 80/90. Hoje a Sociologia está totalmente instalada, não só nas escolas, como também nas universidades e projetos de investigação. E faz-se sentir cada vez mais a articulação da Sociologia Ambiental com as outras ciências, o que faz todo o sentido, porque quando estamos a tratar de questões ambientais estamos também a tratar de questões sociais. São as pessoas que estão na origem dos problemas, são as pessoas que os sofrem, e são as pessoas que os solucionam. A sociedade é fundamental para resolver e para intervir na resolução dos problemas ambientais.

 

E na sua intervenção ficou claro que é necessária uma mudança. Pergunto-lhe: De que forma é que o processo educativo pode ir além das quatro paredes de uma sala de aula? Como é que é possível que o conhecimento seja, de facto, o alicerce mestre de uma mudança concreta?

A mudança social é algo, como sabemos, complexo e difícil. Consegue-se por vias de tecnologias, consegue-se por via de revoluções e consegue-se através do conhecimento e da educação. E por isso é que ela é tão importante dentro e fora das escolas, respondendo à sua pergunta. Vivemos num mundo em que a ciência faz parte do nosso quotidiano. Os cientistas são chamados a intervir muito mais, porque as pessoas têm de ter ferramentas de descodificação para a complexidade dos problemas com que se deparam no dia a dia. O conhecimento é absolutamente decisivo para a mudança. E por isso é muito importante esta intervenção dos cientistas a vários níveis: desde as escolas primárias, até às autarquias, chegando ao espaço público. Por outro lado, as escolas têm sempre um papel fundamental. É lá que estão as novas gerações que vão fazer o futuro. Nós não sabemos muitas coisas, mas há uma coisa que sabemos: os jovens que hoje estão nas escolas amanhã vão ser os decisores. Por isso, os professores têm na mão aquilo que é mais precioso e fundamental para a mudança numa sociedade. Efetivamente, hoje em dia é também muito importante a educação extra-escolar. Porquê? Porque há o chamado “processo deseducativo” que acontece quando as crianças e os jovens saem da escola e entram no processo triturador ligado à sociedade de consumo em que vivemos. Todas as entidades devem estar envolvidas e dinamizar projetos que atraiam os mais novos para que estes quando saiam da escola possam ter outro tipo de atividade. E isso é possível, isso é viável. E já está a acontecer em algumas autarquias. O que é preciso é haverem mais agentes no terreno que se envolvam neste processo de mudança. É necessário envolver as crianças e os jovens a seguir à escola em projetos positivos que pairem, por exemplo, sobre as áreas protegidas… Têm tanto por fazer…Há tanta necessidade de recolher dados, de fazer trabalho de campo…Têm que ser coisas que envolvam, estimulem e entusiasmem os mais novos. É possível fazê-lo e é urgente fazê-lo.

 

E são projetos como este, de que é exemplo o Eco-Escolas, que são capazes de mostrar isso mesmo aos mais jovens. Não só ensinar, mas incluir e fazer com que os jovens sejam parte integrante dessas mesmas aprendizagens…

É evidente. O Eco-Escolas é extremamente importante porque envolve diretamente os jovens e tem uma dinâmica muito forte no país, o que é notável. E há outros que podem vir a ter também, e outras ONG que trabalham no terreno e que já tem projetos muito interessantes. Mas é possível e importante trazer outras instituições e entidades para criar esse tal movimento de projetos extra-escolares que sejam estimulantes e que façam a diferença. Há pouco eu falava, por exemplo, numa certa recusa que os jovens têm hoje, e nós vimos isso nos inquéritos, relativamente aquilo que é tudo o que eles chamam a política, os partidos… são altamente críticos relativamente a essas áreas, e percebe-se perfeitamente o porquê. Mas é fundamental chamar os jovens para a vida cívica e política. A intervenção no espaço público, inclusive no espaço público de proximidade, não pode ser deixada aos decisores políticos e aos mais velhos. Muitas vezes estes tipos de projetos ficam muito confinados às escolas, mas tais projetos não podem ficar ali confinados. Os jovens têm de ser tratados como adultos e responsáveis. E tornam-se também assim mais entusiastas, porque conseguem ver a capacidade que têm de intervir no país, nas instituições, e, portanto, na melhoria da qualidade seja da informação, seja da ação pela qualidade ambiental do país.

 

 

Rúben de Matos