Nemátode da Madeira do Pinheiro: uma grave ameaça à nossa floresta

A floresta constitui um bem precioso à escala mundial, do ponto de vista ecológico, paisagístico e económico, sendo por isso um património que deve ser cuidado e preservado. O nemátode da madeira do pinheiro representa uma grave ameaça aos ecossistemas florestais, causando a doença da murchidão do pinheiro e tem como seu aliado um inseto vetor – o Monochamus galloprovincialis.

Luís Bonifácio, especialista em Entomologia Florestal e investigador no Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV), na Unidade Estratégica de Investigação e Serviços de Sistemas Agrários e Florestais e Sanidade Vegetal, fala-nos um pouco sobre a atual situação desta doença e dos seus efeitos na floresta, com especial incidência sobre a floresta de pinho portuguesa.

  1. Que tipo de interação existe entre o nemátode, o inseto vetor e a planta hospedeira?

O Nemátode da Madeira do Pinheiro (NMP) é um organismo microscópico (≈1/3 de mm) parasita de várias espécies de árvores coníferas (pinheiros, abetos, entre outras); uma vez no seu interior alimenta-se das células vegetais acabando por causar a sua morte. Como o nemátode não tem capacidade de se movimentar entre uma árvore morta/infetada para outra árvore saudável, necessita ser transportado por um inseto, inseto-vetor e, em Portugal, o único vetor é o longicórnio do pinheiro, Monochamus galloprovincialis (Figura 1).

Figura 1 – Adultos de Monochamus galloprovinciallis (fêmea e macho, respetivamente).

Este inseto quando na forma adulta alimenta-se da casca fina dos pinheiros bravos saudáveis, causando uma pequena ferida que, em situações normais, é imediatamente coberta pela resina produzida pelo pinheiro, não causando qualquer dano à árvore (a resina é a principal defesa dos pinheiros contra agressões para prevenir a entrada de organismos potencialmente perigosos).

Posteriormente, para colocar os seus ovos, o inseto irá fazer um pequeno orifício com as mandíbulas na casca de pinheiros já enfraquecidos por um qualquer agente biótico (existem, por exemplo, insetos escolitídeos capazes de atacar em grupo de modo que superam as defesas dos pinheiros) ou fator abiótico, tais como secas prolongadas, incêndios florestais ou tempestades. Numa árvore saudável, a resina iria envolver e matar os ovos.

O M. galloprovincialis é uma espécie autóctone que originalmente era inofensiva dos pinhais portugueses. Agora, ao transportar o nemátode, este aproveita as feridas causadas durante a alimentação do inseto (outrora inócuas) para entrar nos tecidos do pinheiro, num processo muito rápido antes que este consiga cobrir as feridas de resina, infeção que será rapidamente fatal.

 

  1. Em que fase do ciclo de vida do Monochamus galloprovincialis o nemátode ocupa o seu hospedeiro?

 

A interação do nemátode com M. galloprovincialis ocorre apenas na fase de inseto adulto. Durante todo o Outono e Inverno, nos pinheiros em declínio ou já mortos apenas encontramos a fase larvar do inseto. Durante Abril ocorrerá a passagem de larva para pupa e posteriormente a formação dos insetos adultos.

O nemátode está presente aos milhões por todo o pinheiro e aí permanecerá até que a metamorfose do inseto se conclua no interior de uma câmara de pupação  (Figura 2) escavada pela larva no último estádio, com a formação do inseto adulto: só então ocorre a movimentação do nemátode para o interior do inseto, que passados poucos dias escavará com as mandíbulas um orifício circular para emergir da árvore hospedeira morta.

 

Figura 2 – Galerias de Monochamus galloprovinciallis.

Os nemátodes irão permanecer no interior do aparelho respiratório dos insetos  até à 2ª- 3ª semana de vida livre, altura em que começam a migrar para as árvores hospedeiras, aproveitando as feridas na casca causadas aquando da alimentação do inseto.

 

  1. Quais são os primeiros sintomas que uma árvore infetada apresenta?

O primeiro sintoma não é visível a olho nú mas muito importante no caso do pinheiro bravo que é a interrupção completa da produção de resina. Este sintoma é apenas visível quando provocamos uma pequena ferida no tronco do pinheiro e esta avaliação deve ser interpretada com cuidado, pois certas zonas do tronco podem ter os canais de resina danificados por outras causas.

No entanto, cerca de um mês a mês e meio após a infeção, as agulhas do pinheiro começam a ficar amarelas e pendentes, primeiro sintoma mais visível que confere o nome de Doença da Murchidão dos Pinheiros (Figuras 3 e 4). Com o avançar do tempo a copa fica totalmente castanha e o pinheiro morre.

Figura 3 e  4 – Pinheiros com sinais de declínio- Península de Setúbal (Tróia).
(Sintomatologia que poderá estar associada à DMP).
  1. Quais as principais estratégias que estão a ser implementadas no controlo desta doença?

O controlo da DMP tem duas fases:

1 – Nos meses de Inverno procede-se à prospeção e identificação dos pinheiros com sintomas de declínio ou já mortos e seu abate e remoção da floresta, o mais rápido possível. Com este procedimento elimina-se tanto o agente causador da doença como o seu inseto-vetor.

2- Nos meses de Verão e coincidindo com o período de voo do inseto-vetor devem ser instaladas armadilhas com atrativos para a captura dos insetos-vetores, ou para controlar as populações dos escolítideos, igualmente perigosos para os pinhais.

 

  1. Nos últimos 10 anos, como evoluiu a dispersão da Doença da Murchidão do Pinheiro a nível nacional? Quais são as zonas mais críticas em Portugal?

 

A dispersão da DMP em Portugal pode ser descrita como tendo duas fases.

A primeira fase, que está compreendida entre a deteção do NMP, em 1999, e 2008, a doença encontrava-se restrita à península de Setúbal, apesar de todos os anos expandir ligeiramente a sua área.

A segunda fase, é determinada pela deteção em 2008 de novo foco da doença, na região da Lousã. Esta região é muito montanhosa, pelo que a situação é mais crítica pois a operação de localização e remoção dos pinheiros com sintomas é muito mais difícil, complicada e financeiramente muito mais onerosa.

Por outro lado, se na primeira fase, todas as operações para o controlo desta doença estavam a cargo da Autoridade Nacional para a Floresta (atual Instituto para a Conservação da Natureza e das Florestas), a partir sensivelmente desta altura, os proprietários florestais foram responsabilizados pela remoção dos pinheiros mortos, o que frequentemente não é cumprido.

 

  1. Neste momento, a presença desta doença em território nacional está controlada ou há evidências da sua expansão?

Até 2008 a área afetada encontrava-se relativamente controlada, depois desta data a doença expandiu-se em muito maior ritmo, ao ponto do Governo Português ter sido obrigado a declarar, perante as Autoridades Europeias, todo o território Nacional como zona afetada pela Doença da Murchidão dos Pinheiros, ficando comprometido a controlar a sua dispersão apenas numa faixa de 20 km junto à fronteira com Espanha.

 

Muito obrigada pela sua colaboração!

 

 

Bruna Gameiro, Bruna Pablo, Inês Sobreira, Leonor Roquette