Na Reserva Natural do Paul do Boquilobo

Um grupo de alunos da Escola Profissional Gustave Eiffel do pólo do Entroncamento (GE) visitaram no dia 15 de fevereiro, a Reserva Natural do Paul do Boquilobo, localizada no concelho da Golegã pertencente ao distrito de Santarém, com o objetivo de conhecer a importância da mesma na conservação e preservação da biodiversidade

Em Portugal encontram-se 12 áreas classificadas pela UNESCO como Reservas da Biosfera, territórios destinados a conservar a diversidade biológica conciliada com desenvolvimento sustentável baseado nas comunidades locais e no conhecimento científico.

– Acreditam, que aqui tão perto localiza-se a primeira a ser classificada? – Sim, classificada desde 1981, pela UNESCO, o Paul do Boquilobo foi a 1ª Reserva da Biosfera em Portugal (já antes criada pelo DL nº198/80, Reserva Natural do Paul do Boquilobo (RNPB) , por se considerar uma área de planície aluvial (as chamadas lezírias) muito procurada por diversas espécies de aves e pela sua vegetação aquática densa muito importante para a nidificação da fauna aquática. Ainda ao abrigo da convenção RAMSAR, foi classificada como zona húmida de proteção especial da Diretiva Aves.

Foi num dia solarengo, mas frio, que por mentoria dos nossos professores nos equipámos de galochas nos pés, roupa quentinha e impermeável para conhecer este espaço. Ah, e não esquecemos a máquina fotográfica, que o Francisco levou, nem a prancheta e os lápis para o João desenhar!

Na chegada às instalações o acolhimento foi feito pelos técnicos da RNPB; o Fernando (F.) e a Sónia (S.). Um grupo de alunos havia preparado algumas questões que gostavam de lhes fazer mesmo antes de percorrerem o trilho programado. De modo afirmativo acenaram as cabeças e a Mariana (AGE_M) fez rolar essas perguntas de imediato.

AGE_M: Com a classificação desta reserva, quais as mudanças sentidas neste território?

S: Com o reconhecimento da existência de valores naturais imprescindíveis proteger e salvaguardar e outros estatutos de proteção, foi necessário delimitar uma área de território, cerca de 817ha, e definir um plano de ordenamento com as diferentes áreas de intervenção, definindo desde logo medidas de proteção assim como interditar algumas atividades que aqui se exerciam.

AGE_M: É permitido caçar ou pescar na RNPB?

S: De acordo com o Plano de Ordenamento da Reserva do Paul do Boquilobo, essas são duas atividades interditas de praticar dentro dos limites da RNPB.

AGE_M: Quais as espécies protegidas na RNPB?

S: Todas as espécies dentro dos limites da RNPB, à exceção das espécies invasoras, são protegidas. No entanto as diversas espécies apresentam diferentes estatutos de proteção, atendendo à sua vulnerabilidade e/ou abundância. Salienta-se na RNPB a importância da avifauna, reconhecida através da criação da Zona de Proteção Especial para Aves Selvagens do Paul do Boquilobo ou ainda a existência de algumas espécies endémicas e ameaçadas identificadas na RNPB, quer da flora ou fauna.

AGE_M: Qual o significado de espécies endémicas? Quais as existentes na RNPB?

S: Considera-se endémica aquela espécie animal ou vegetal que ocorre somente em uma determinada área ou região geográfica. O endemismo é causado por quaisquer barreiras físicas, climáticas e biológicas que delimitem com eficácia a distribuição de uma espécie ou provoquem a sua separação do grupo original. Quando a separação ocorre por um longo período, o grupo sofre uma seleção natural e diferencia-se de outros membros da espécie.

Na RNPB temos vários endemismos quer ao nível da flora como o Narcissus fernandesii ou Damasonium bourgaei, quer ao nível da fauna, como por exemplo o Ruivaco(Achondrostoma oligolepis), as Boga-portuguesa e Boga-de-boca-arqueada (Iberochondrostoma lusitanicum e olisiponense) no grupo dos peixes, o Tritão-de-ventre-laranja (Lissotriton boscai), Sapo-parteiro-ibérico (Alytes cisternasii), o Lagarto-de-água (Lacerta schreiber) no grupo dos anfíbios, a Águia-imperial-ibérica (Aquila adalberti) . F, interveio dizendo, aqui na RNPB já eu avistei um juvenil, sendo esta categoria criticamente em perigo no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal (LVVP).

Continuando, S. referiu outras espécies endémicas nos grupos de mamíferos; como a Lebre ibérica (Lepus granatensis) ou o Rato-de-cabrera (Microtus cabrera), de insetos, de borboletas; não deixando de falar das Pseudiphilotes panotes como endemismo ibérico e Fritilária mediterrânea (Euphydryas desfontainii) que embora não sendo endémica do mediterrâneo está ameaçada em Portugal.

AGE_M: Quais os efeitos das alterações climáticas sobre a RNPB?

S: Em primeiro lugar gostaria de referir que as áreas protegidas, em particular as zonas húmidas são e serão essenciais no combate às alterações climáticas dada a sua importância na captura do carbono.

Quanto aos efeitos expectáveis podemos desde logo referir as alterações nos habitats de organismos vivos levando à extinção de espécies, alterações nos padrões de precipitação com influência na incerteza das estações e à ocorrência de fenómenos extremos (tufões, furacões, cheias, incêndios) com maior regularidade, dificultando o “aconchego” para aqui fazer ninho e, portanto, menos espécies visitarão a RNPB.

AGE_M: É possível visitar a RNPB?

S: Sim. Existem trilhos e observatórios de aves preparados para receber visitantes, devendo formalizar-se o pedido de visita antecipadamente para grupos com mais de 10 pessoas. Ah, não esquecer, a grande variabilidade das suas condições pedestres ao longo do ano.

Segurando o seu bastão em madeira, F. propõe avançar com a visita deixando algumas indicações importantes a ser seguidas ao longo do Trilho Vale da Negra: o silêncio com o mínimo de perturbação aos animais, a proibição de recolher plantas ou animais, o respeito pela sinalização e muito importante deixar o trilho limpo.

E lá seguimos fascinados com a percepção de piares das aves que F. nos ia alertando, com os aromas que F. fazia chegar ao nariz, com a observação de espécies entre os céus e o meio aquático nas paragens que F. ia propondo. O Francisco ia fotografando tanto do que estávamos a vivenciar.

Já com alguns quilómetros caminhados, avistamos o primeiro observatório de aves do paul, ainda sobre águas do Almonda. E aqui, sentimos as pernas a tremer, não sei se por o observatório se encontrar suspenso sobre troncos de madeira ou se pela beleza do enorme quadro pintado com uma paleta de cores e piares, que aquela paisagem nos fazia parecer.

Os binóculos esses permitiam a entrada naquele quadro com a vontade dele fazer parte, protegendo-o e preservando-o para que este nunca se extinga.

No regresso, ainda foi possível avistar uma série de peixes, brincar com uma rã, e a promessa de voltarmos, desta vez seguindo até ao observatório Trilho Braço de Cortiça.

Á Sónia e ao Fernando agradecemos ter estado neste laboratório vivo.

 

Francisco Cardoso, Mariana Martins , João Pinho, Rui Rodrigues