Insetos são recurso para o tratamento de resíduos orgânicos e produção de composto

A prática agrícola tem um enorme impacto sobre o ambiente, principalmente sobre os solos, a vegetação e a qualidade das águas, afetando diretamente a saúde humana. Com a evolução da agricultura e com o aumento da população mundial, a fertilização química tornou-se um dos métodos com maior sucesso, mas a sua utilização excessiva acarreta vários problemas. Com o intuito de minorar as consequências prejudiciais associadas ao uso constante de fertilizantes químicos, têm sido investigadas soluções alternativas aos mesmos, por exemplo, os fertilizantes orgânicos ou biofertilizantes, produzidos com recurso a insetos e larvas de insetos.

De acordo com a Direção Regional de Agricultura e Pescas do Centro, a prática agrícola tem um enorme impacto sobre o meio ambiente, principalmente sobre os solos, a vegetação e a qualidade das águas, afetando diretamente a saúde humana.

Imagem 1. Prática agrícola (fotografia de Etienne Girardet).

Segundo informação de disponibilizada pela Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO), através do relatório do Painel Técnico Intergovernamental sobre os Solos, de 2015, com a evolução da agricultura e com o aumento da população mundial, a fertilização química tornou-se um dos métodos com maior sucesso. A sua utilização excessiva acarreta vários problemas e questões ambientais, sendo desta forma importante o estudo de novas técnicas alternativas à fertilização química, com a finalidade de reduzir os efeitos negativos associados, sendo que, e tendo em conta informação recolhida junto de Fernando Felizes, investigador do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV), foi proposta recentemente a utilização de insetos como fertilizante orgânico.

As plantas necessitam de elementos nutritivos e quantidades adequadas, de forma a se desenvolverem devidamente, para tal, é essencial um solo com essa capacidade nutritiva. Geralmente, os solos não contêm essas características, e por essa razão, são utilizados os fertilizantes, melhorando, assim, a nutrição dos solos, obtendo maiores produções com melhor qualidade.

Com o intuito de minorar as consequências prejudiciais associadas ao uso constante de fertilizantes químicos, têm sido investigadas soluções alternativas aos mesmos, por exemplo, os fertilizantes orgânicos ou biofertilizantes.

Os fertilizantes orgânicos são fontes minerais que contêm uma quantidade moderada de nutrientes essenciais para as plantas, nomeadamente o azoto, o fósforo e o potássio. A sua gradual libertação mantém um equilíbrio nutritivo, possibilitando o desenvolvimento saudável das plantas cultivadas. Para além disso, atuam como fonte de energia dos microrganismos do solo, que por sua vez, melhora a estrutura do mesmo e o crescimento das culturas agrícolas. Os biofertilizantes são, normalmente, considerados como fertilizantes de libertação lenta, diz Hitha Shaji, investigadora da Escola de Biociências da Universidade Mahatma Gandhi, na Índia.

À semelhança da conversão de resíduos orgânicos por microrganismos e minhocas em húmus, tem sido proposta a compostagem efetuada por larvas de insetos. Esta metodologia dispõe de interesses, não só agronómicos, como também económicos. No processo de compostagem com larvas de insetos ocorre a produção de larvas com valor proteico, que podem ser utilizadas na alimentação animal, e material orgânico, ou composto, que pode ser aproveitado como fertilizante orgânico.

Imagem 2. Ciclo de vida da mosca (adaptado de Experto Animal).

O Decreto-Lei n.º 103/2015 define “composto” como o produto obtido pela “degradação biológica aeróbia dos resíduos orgânicos até à sua estabilização e produção de uma substância húmica, utilizável como corretivo orgânico do solo”. Apesar deste diploma legal ter sido, entretanto, revogado, a definição mantém-se, sendo que, de acordo com Catarina Esteves, do Instituto Superior de Agronomia, no caso do composto gerado pela ação de degradação biológica por insetos, a designação correta deveria ser “entomocomposto”, não existindo, em Portugal, legislação aplicável para este termo, não sendo, por isso, utilizado recorrentemente.

Apesar do conhecimento sobre as potencialidades de utilização do composto orgânico produzido por insetos como fertilizante ser limitado, vários estudos elencados pela FAO na publicação Edible insects: future prospects for food and feed security, apontam algumas espécies de insetos como adequadas para a biodegradação orgânica, sendo exemplo, a mosca doméstica, a mosca soldado negro e o tenébrio (género de besouro).

Imagem 3. Mosca doméstica (fotografia de Robert Kresse).

O composto proveniente da bioconversão de resíduos orgânicos pelas larvas de insetos apresenta, na generalidade, boas características para o seu uso como fertilizante orgânico. Porém, de forma a avaliar o seu potencial e comparar o seu desempenho com os fertilizantes químicos, deve ser estudado o seu efeito na produtividade das culturas agrícolas. É, também, importante a classificação do tipo de resíduos orgânicos possíveis de ser degradados pelas larvas, determinando o valor fertilizante do composto gerado.
Entre as três espécies de insetos referidas, as larvas da mosca soldado negro já foram utilizadas em experiências. O composto destas já foi estudado para avaliação do potencial fertilizante em diversas culturas, tal como, o manjericão, a cebola, o nabo e a alface.

O Projeto Entovalor é liderado pela EntoGreen e tem a colaboração de quatro parceiros, o INIAV, a AgroMais, a Rações Zêzere e a Consulai e permitiu introduzir um novo conceito quanto à produção de insetos através da conversão de subprodutos vegetais à escala semi-industrial. Para além da conversão de várias toneladas de subprodutos gerados na agroindústria da região de Santarém, foi também possível produzir várias toneladas de larvas de inseto que, futuramente, foram processadas em farinha. Esta foi testada como substituto parcial do bagaço e óleo de soja na alimentação de aves.

De um modo geral, o projeto permitiu gerar produtos finais inovadores que contribuem para reduzir a dependência do setor agropecuário da importação de matérias-primas para a alimentação animal e fornecer uma alternativa aos fertilizantes químicos e na nutrição vegetal, originando um fertilizante orgânico capaz de conferir nutrientes às plantas, mas também melhorar a estrutura do solo, a sua saúde e capacidade de reter água. Assim, este processo está assente em princípios de económica circular, reduzindo desperdícios e aumentando a eficiência da utilização dos recursos naturais e por conseguinte, o respeito pelo meio ambiente.

Imagem 4. Processo de bioconversão (Adaptado de Entogreen).

Posto isto, o papel dos insetos para o tratamento de resíduos orgânicos tem suscitado um compromisso crescente da comunidade científica no domínio da agricultura e da proteção ambiental, no entanto, é necessário haver uma progressão significativa neste setor, com a melhoria nas capacidades genéticas dos insetos, do pré-tratamento dos substratos e da adequação das técnicas de fertilização.

Adriana Barroca, Inês Barria, João Rosado, Matilde Parente