Gaivota e Chorão, duas pragas num paraíso!

O Arquipélago das Berlengas situa-se a 5.7 milhas do Cabo Carvoeiro e é constituído por três grupos de ilhéus: Berlenga Grande e recifes adjacentes, Estelas e, um pouco mais distante, Farilhões.

Foto 1-Falésias graníticas com plantas halófitas, 30 maio de 2018

O arquipélago fica situado na Plataforma Continental da fachada oeste da Península Ibérica junto da cidade de Peniche.
A ilha da Berlenga, a maior do arquipélago, é constituída essencialmente por rochas eruptivas nomeadamente granitos róseos.

O Arquipélago das Berlengas e o mar envolvente foram classificados como Reserva Natural em 1981, com uma área terrestre de 104 hectares e uma área marinha de 9.456 ha.

De uma extrema beleza natural tornou-se uma preocupação ambiental e de equilíbrio do ecossistema. No sentido de ajudar a reverter esta situação, está em curso um projeto LIFE+, coordenado pela Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves em parceria com outras entidades, em particular o ICNF, instituto responsável pela gestão da reserva natural.

De entre as espécies nidificantes destacam-se o corvo-marinho-de-crista ou galheta que constrói o seu ninho nas falésias junto ao mar, em locais praticamente inacessíveis ao Homem e a pardela-de-bico-amarelo que apenas permanece na Berlenga durante o período de reprodução. As Berlengas são o único sítio em Portugal Continental onde a cagarra nidifica e desde 1980 tem existido um aumento anual por volta dos 10% da sua população reprodutora graças a medidas de conservação. As cagarras podem ser avistadas ao longo de toda a costa continental.

Foto 2- Cagarra em nidificação, 30 maio de 2018

São ainda nidificantes, a gaivota-de-asa-escura e a gaivota-argêntea-de-patas-amarelas, a qual possui o estatuto de praga, dada o elevado número de indivíduos que a sua população atingiu nos anos 80 e 90 do século passado. Para responder a este problema, a Reserva leva a cabo, desde meados da década de noventa, uma polémica campanha de controle, que passa pela destruição anualmente de milhares de ovos desta espécie. Tudo leva a crer que um dos fatores que contribuiu para este crescimento populacional foi a existência de lixeiras no continente, que perduraram até meados da década de 90, as quais forneciam quantidades ilimitadas de alimento às gaivotas. Assim, com alimento abundante, na região Oeste, e disponibilidade de abrigo nas Berlengas, a situação na ilha tornou-se insustentável. De referir que a gaivota-de-patas-amarelas é uma espécie oportunista de grande plasticidade adaptativa e competitiva, utilizando quase todo o tipo de alimentos, e com um elevado potencial reprodutor, pelo que facilmente atinge proporções de praga.

As medidas radicais de controlo da população, passaram numa primeira fase pelo abate de gaivotas adultas através de alimento envenenado e desde há alguns anos pelo controle da natalidade da população das gaivotas na Berlenga através da destruição de ovos. A colónia, hoje com menos de 20 mil casais, necessita ainda de uma atenção especial, para que seja possível atingir a estabilidade com o habitat.

No que diz respeito à flora entre as cerca de 100 espécies que podemos encontrar nas Berlengas encontram-se três espécies endémicas: a Armeria berlengensis, a Herniaria berlengiana e a Pulicaria microcephala, até agora  bastante ameaçadas pela presença de animais herbívoros, como o rato-preto e o coelho e pela competição com espécies vegetais invasoras exóticas, como o Chorão, que cobre vastas porções da ilha, e pela nitrificação do solo, causada pelos excrementos da excessiva população de gaivotas.

O “Chorão”, é uma planta que começou a preocupar os ecologistas dada a sua extrema facilidade de adaptação, rapidez de crescimento e propagação, proporcionando um sério desequilíbrio natural na ilha.

Para além das condições ambientais ótimas para o chorão se desenvolver na ilha da Berlenga, sabe-se que os ratos-pretos, coelhos e as gaivotas-de-patas-amarelas são bons dispersores das suas sementes, o que facilita a sua propagação. Com estas condições o chorão tem um crescimento com o potencial de colonizar todo o arquipélago das Berlengas.

Embora as suas flores deem um bonito colorido na paisagem da ilha, nos locais onde se instalou, o chorão cobre todo o solo. Com as suas folhas muito densas e raízes fortes, é uma importante ameaça à conservação das plantas mais raras, como as campainhas-amarelas e a arméria-das-berlengas, cujo lento crescimento não lhe permite competir com o chorão.

Outro problema da invasão de chorão tem a ver com a redução no número de cavidades disponíveis para a cagarra fazer o ninho. Estas aves escavam os seus ninhos no solo que ao ficar completamente coberto pelo chorão tal deixa de ser possível.

Foto 3- Remoção do chorão (planta invasora) em faixas ao longo das curvas de nível do terreno, 30 maio de 2018

Para combater o problema do chorão o projeto LIFE Berlengas está a proceder à remoção total do chorão da ilha das Berlengas e ilhéus adjacentes. Até finais de 2014 o chorão cobria completamente as encostas do carreiro do Mosteiro e a Flandres, estando ainda presente noutros pontos da ilha. Com o início dos trabalhos do LIFE Berlengas, esta situação está a inverter-se. Seguindo diretivas internacionais, a equipa do projeto iniciou a remoção do chorão que é retirado manualmente, enrolado e deixado a secar em cima do tapete do chorão abaixo. Numa segunda fase, as entrelinhas que ficaram com chorão são removidas.

Pedro Libório , Tiago Pereira