Deserto Verde, uma realidade nortenha

A Wildlife Conservation Society alerta que a ação do Homem está a levar ao empobrecimento acelerado das massas florestais, consequência da falta de gestão das florestas. No estudo, revela-se que o norte de Portugal e da Galiza apresentam o pior índice de qualidade de massas florestais da Península Ibérica. No caso destas florestas ibéricas foi, principalmente, o empobrecimento da biodiversidade arbórea, resultante da gestão precária de florestas que levaram a classificar estas massas florestais como o principal flagelo na península ibérica.

Com o olhar imerso  num eucaliptal, Teresa Moreira, emigrante reformada de regresso à terra natal, desabafa, “Quando era criança era tudo diferente, havia muitos carvalhos, cerejeiras, medronheiros, castanheiros, até havia alguns pinheiros mansos! Agora é só eucaliptos e pinheiros bravos”.. Para quem nasceu na década de 40, no Norte de Portugal, é inegável a transformação das florestas nortenhas, nas quais, ao longo dos anos, foi-se impondo especialmente o Eucalyptus globulus nas paisagens desta região. O estudo intitulado ‘Anthropogenic modification of forests means only 40% of remaining forests have high ecosystem integrity’, publicado na revista Nature Communications, lançou um sério alerta para esta situação preocupante vivida em todo o mundo. No caso de Portugal, esta situação é cada vez mais notável a norte, visto que facilmente se percebe a grande desproporção entre a quantidade de eucaliptos, espécie exótica, e a quantidade de espécies autóctones.

Índice de integridade da paisagem florestal (Forest Landscape Integrity Index)

Mais recentemente, foi publicado um outro estudo relativo ao eucalipto intitulado de “Inhibitory effects of Eucalyptus globulus on understorey plant growth and species richness are greater in non-native regions”. O estudo alerta para o preocupante fato de os eucaliptos criarem um autêntico “deserto verde” na paisagem que os envolve, provocando, consequentemente,  uma redução da biodiversidade bastante perigosa, tendo-se aferido no estudo que, em todos os locais e países, a comunidade de plantas sob as copas de Eucalyptus globulus tem menor biodiversidade comparativamente a outras áreas sem esta espécie. O artigo avisa ainda  que, a redução de biodiversidade foi muito maior nas áreas não nativas desta espécie de árvore, como é o caso de Portugal, país em que  se estima que a biodiversidade tenha sofrido uma diminuição de cerca de 51% nas áreas deste estudo. Outro fator importante, relativo à interferência com a biodiversidade arbórea, é o facto de as substâncias químicas, presentes nas folhas dos eucaliptos (extratos das folhas), impedirem o crescimento das raízes de outras espécies nativas, motivo pelo qual os eucaliptais contêm muito pouca biodiversidade fora da sua área nativa. Nestas áreas não nativas, as espécies não conseguiram desenvolver tolerância a estas substâncias químicas emitidas pelo Eucalipto, contrariamente às espécies Australianas “vizinhas” ao Eucalipto, que desenvolveram esta tolerância, permitindo a existência de biodiversidade. Para além de toda esta problemática, o eucalipto é uma espécie de crescimento rápido e caduca, consumindo bastante água do subsolo, o que pode conduzir à drenagem de águas subterrâneas, poços e fontes e à não regeneração do solo, tornando-se este num solo pobre e, relativamente à biodiversidade, pouco enriquecido.

Foi no início do século XIX, que o eucalipto atracou em Portugal e desde então começou a ser reconhecido exponencialmente pelo seu rendimento económico a curto prazo e, Teresa afirma, “um carvalho demora 60 ou mais anos para ter tamanho para ser abatido, mas o eucalipto ao fim de 8 anos está bom para ser cortado, por isso é melhor para quem quer fazer as terras, que pouco ou nada valem, mais rentáveis”. A alta produtividade de madeira com menores custos e com uma boa rentabilidade, face a outras espécies, levou esta espécie exótica a representar cerca de um quarto da floresta nacional, 845 mil hectares, segundo o 6.º Inventário Florestal Nacional (IFN6, 2019). A contribuição desta árvore, como matéria prima, é determinante na produção de pasta de papel, setor que representa cerca de 2% do PIB e 9% das exportações de Portugal. O seu uso para a indústria, se regulamentado, pode ajudar a reduzir a pressão para utilizar árvores nativas como fonte de matéria prima, podendo contribuir indiretamente para a proteção dessa vegetação nativa. No entanto, não é o que esta a verificar-se em Portugal, onde a plantação de eucaliptos está a ocorrer desenfreadamente e sem controlo.

Segundo especialistas, o reordenamento florestal tem de ser encarado como um desígnio nacional, de modo sério e sustentável. Para estes esepcialistas,  Portugal necessita de uma verdadeira reforma florestal para combater os crescentes e letais desertos verdes.

Webgrafia:

6.º inventário Florestal Nacional – http://www2.icnf.pt/portal/florestas/ifn/resource/doc/ifn/ifn6/IFN6_Relatorio_completo-2019-11-28.pdf

Anthropogenic modification of forests means only 40% of remaining forests have high ecosystem integrity – https://www.nature.com/articles/s41467-020-19493-3

Forest Landscape Integrity Index- https://www.forestintegrity.com/?fbclid=IwAR2YWGq4y3PtfmnV6r39EbA56Lkef7GGXuIrAhF-T4qP1PYHzGyMouoenzA

Inhibitory effects of Eucalyptus globulus on understorey plant growth and species richness are greater in non-native regions – https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1111/geb.12676

Diogo Martins