Os Rins do Planeta

 Os sapais representam ecossistemas muito importantes porque asseguram a reciclagem de nutrientes e promovem a remediação natural do sistema através da fito estabilização de poluentes. Os primeiros resultados de um estudo realizado no sapal do Tejo (Parque das Nações) apontam para o contributo da planta Spartina maritima na fitorremediação dos solos contaminados com Cobre o que, pelo menos potencialmente, irá reduzir a toxicidade para outras espécies que dependem destes habitats. Este processo demonstra a importância dos sapais e dos serviços por eles prestados na depuração dos sistemas estuarinos.

Os estuários são ecossistemas biológicos que possuem uma enorme biodiversidade e uma elevada produtividade. Frequentemente, nas margens dos estuários, em condições de baixo hidrodinamismo, desenvolvem-se os sapais.

Sapal é a designação dada a um terreno muito húmido que é inundado temporariamente pelas águas de um rio e que, quando localizados junto à foz, variam com a subida e a descida das marés. Desta forma, o sapal é alternamente emerso e submerso de acordo com o ritmo das marés.

De uma forma geral, este é caracterizado por uma vegetação pobre e, por isso, maioritariamente baixa, de 0,3m a 1m., constituída por espécies halófitas (aquelas cujo crescimento é favorecido pela presença de sal). As plantas de sapal conseguem suportar rápidas variações de salinidade, de temperatura e ainda o impulso de correntes fortes e hidromorfia (estado de saturação da água) permanente na zona radicular (Moreira, 1987).

Os sapais representam ecossistemas muito importantes porque asseguram a reciclagem de nutrientes e promovem a remediação natural do sistema através da fito estabilização de poluentes. Podem garantir um hot spot de habitats para numerosas espécies (quer marinhas quer terrestres) e têm uma elevada produtividade primária líquida – quantidade de matéria orgânica produzida em fotossíntese pelas plantas (Imhoff et al., 2004).

Em Portugal localiza-se um dos maiores estuários da Costa Atlântica da Europa: o Estuário do Rio Tejo, que apresenta um área total de aproximadamente 300km2 na baixa-mar e 340km2 na preia-mar. As zonas Sul e Este do Estuário são compostas por vários sapais.

Frequentemente, nos sapais, nomeadamente no Sapal do Rio Tejo, a poluição é o principal fator de stress para a biodiversidade, visto que se localiza na proximidade de uma zona urbana e/ou industrial. Esta é devida a acumulação de metais pesados, alta salinidade e encharcamento excessivo. Os metais pesados são elementos não biodegradáveis e apresentam, geralmente, mais de um estado de oxidação. Esses diferentes estados de oxidação determinam sua mobilidade, biodisponibilidade e toxicidade.

Segundo Baker (1981), as plantas desenvolvem três estratégias básicas para crescer em locais contaminados: plantas excluidoras de metal – estas plantas impedem eficazmente a acumulação de metais, especialmente nas suas partes aéreas, sob uma larga escala de concentrações de metal no solo; plantas indicadoras de metal – estas plantas acumulam metais nos seus tecidos como reflexo dos níveis de metal existentes no solo; plantas acumuladoras de metal – estas espécies de plantas (hiperacumuladoras) podem concentrar metais nos seus tecidos em níveis muito superiores aos que existem no solo.

A concentração dos elementos químicos nas plantas depende da disponibilidade destes no solo e da capacidade que as plantas têm para absorver e transferir os mesmos para as suas diferentes partes, através do xilema e floema (Kabata Pendias & Pendias, 1992).

De um modo geral, o tempo de residência de alguns metais pesados em solos é citado por Bridges[1] (1991) como sendo entre 75 e 380 anos para o Cd, 500 a 1000 anos para o Hg e os mais fortemente adsorvidos são As, Cu, Pb, Se e Zn que têm tempo de residência de 1000 a 3000 anos. Esses elementos ainda podem ser bioacumulados, ou seja, podem ser acumulados nos seres vivos. Dessa forma, eles podem passar de espécie a espécie ao longo da cadeia alimentar, sendo encontrados maiores teores em níveis mais altos da mesma, correspondendo aos predadores. Tendo em conta que a acumulação de alguns metais em algumas plantas está relacionada com a concentração no sedimento (Crowder, 1991), um grupo de alunos do Colégio Valsassina interessou-se em desenvolver um estudo, entre novembro de 2012 e abril de 2013, onde se pretende quantificar a concentração de cobre numa planta típica dos sapais (Spartina marítima) assim como nos sedimentos do solo onde esta se encontra. Para Isabel Caçador, professora e investigadora da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, esta planta desempenha um importante papel na fitorremediação ao nível dos sistemas estuarinos.

De acordo com Bouezmarni e Wollast (2005) é importante o estudo dos sedimentos dos sapais, porque a composição dos sedimentos possibilita a identificação de episódios de contaminação antropogénica, funcionando, assim, como um indicador de qualidade ambiental e o conhecimento dos níveis de contaminação é bastante útil para a previsão de uma futura situação ecológica do ecossistema em estudo.

Spartina-maritima

Spartina marítima no sapal do Tejo (Janeiro 2013). Spartina marítima (de nome comum Morraça) é uma planta da família das Gramineae, frequente ao longo da costa litoral, principalmente no Centro e Sul do país.

Os primeiros resultados apontam para o papel desta planta na fitorremediação dos solos contaminados com Cobre o que, pelo menos potencialmente, irá reduzir a toxicidade para outras espécies que dependem destes habitats. Este processo demonstra a importância dos sapais e dos serviços por eles prestados na depuração dos sistemas estuarinos, assumindo-se como uns autênticos “rins do planeta”.

Para além da sua importância ecológica, não se pode ignorar o valor económico dos sapais. Por exemplo, de acordo com um artigo publicado na revista Visão, em novembro de 2008[2],  estima-se que cerca de 70% das espécies com interesse piscatório passam uma parte do seu ciclo de vida nas zonas estuarinas.

 

Ana Catarina Pauleta, Beatriz Chagas, Mariana Monteiro. Colégio Valsassina.

 

Agradecimentos

Agradecemos a colaboração da professora e investigadora Isabel Caçador, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, sobretudo na identificação das plantas recolhidas no sapal.

 

Referências Bibliográficas

BAKER A. J. M. (1981). Accumulators and excluders—strategies in the response of plants to heavy metals. Journal of Plant Nutrition 3: 643-654.

BOUEZMARNI M, WOLLAST R. (2005). Geochemical composittion of sediments in the scheldt estuary with emphasis on trace metals. Hydrobiologia: The International Journal of Aquatic Sciences, 540: 155-168.

CROWDER  A. (1991) Acidification, metals and macrophytes. Environ Pollut 71.

IMHOFF, M. L.; BOUNOUA, L.; RICKETTS, T.; LOUCKS, C.; HARRISS, R.; LAWRENCE, W. T. (2004) Global patterns in human consumption of net primary production. Nature, v. 429, p. 870-873.

KABATA-PENDIAS, A.; PENDIAS H. (1992). Trace elements in soils and plant. London: CRC Press.

MOREIRA, M. (1987). Estudo Fitogeográfico do Ecossistema de Sapal do Estuário do Sado, p.247-296.

 

[1] Consultado em

http://scienceblogs.com.br/geofagos/2008/08/metais-pesados-em-solos-metais-como-poluentes-ambientais/

(07/04/2013).

[2]Disponível em http://visao.sapo.pt/agua-salobra-e-vida=f588536. Consultado em 23 de abril de 2103.

Ana Catarina Pauleta, Beatriz Chagas, Mariana Monteiro