Comboio da Biodiversidade

O Comboio da Biodiversidade saiu de Santa Apolónia para uma viagem circular que atravessa o Estuário do Tejo e o Vale do Sado. 

Os passageiros do Comboio da Biodiversidade foram pessoas ligadas a grupos de decisão político-económica, à economia e ao sector empresarial, ao ambiente e gestão de recursos naturais, para além de figuras públicas que fazem a opinião e que dão o exemplo.

Os guias do comboio foram, na sua maioria, investigadores da Universidade de Lisboa e representam as várias áreas do conhecimento relacionadas com a temática da Biodiversidade.

Com este evento pretendeu-se que a biodiversidade dentro do comboio fosse tão grande quanto fora dele, apelando e demonstrando assim a necessidade de mobilização de todos.

O Comboio da Biodiversidade teve como um dos seus objectivos específicos apoiar a candidatura da Arrábida a Património Mundial da UNESCO.

A convite da organização, dois Jovens Repórteres para o Ambiente estiveram presentes neste evento.

De seguida divulgamos o artigo elaborado por Bruno Loureiro e Inês Pascoal:

Biodiversidade Versus Ignorância

comboio_biodiversidadeNo dia 13 de Março de 2010 realizou-se a primeira iniciativa do projecto Bioeventos 2010: o Comboio da Biodiversidade. Tendo partido de Santa Apolónia, por volta das 10h, o comboio dividia-se em três carruagens. Em duas destas, decorreriam tertúlias temáticas. Escolhemos viajar na 1ª carruagem, onde tivemos o prazer de assistir a um painel que teve como moderadora Luísa Schmidt, que afirmou que “há uma grande incultura sobre a biodiversidade, não há a mínima noção do que ela é. Enquanto isso for um assunto de alguns cientistas bizarros, continuaremos a perder a biodiversidade. É preciso explicar porque é que não conservar tem mais custos do que conservar, porque sem isso a biodiversidade em Portugal não parará de ser arruinada”.

De seguida tivemos a oportunidade de ouvir três oradores sobre temas diversos. Começou Jorge Palmeirim com o tema “Património natural das regiões atravessadas e sua conservação”, onde após o esclarecimento do conceito de biodiversidade, levantou a questão “Já retirámos da biodiversidade tudo aquilo que precisamos para a nossa espécie?”, à qual respondeu que não, dado que existem cerca de 80.000 espécies comestíveis e nós apenas comemos uma parte delas. O orador que se seguiu foi João Ferrão, com o tema “A importância do planeamento na conservação”, onde não só referiu a degradação das paisagens da zona, como também os instrumentos “Legais, financeiros, fiscais, políticos, que sejam sensíveis à questão da biodiversidade”. A intervenção seguinte ficou a a cargo de Carlos Silva Neto, com o tema “A relação das comunidades humanas com a biodiversidade”, o que despertou bastante o nosso interesse, especialmente ao referir que “Na Inglaterra, há 23 espécies endémicas, e que só no percurso que iríamos fazer no comboio (Santa Apolónia – Setúbal), há 31 espécies endémicas! Temos um património natural enormíssimo”.

Logo após a apresentação destes três temas, foi dada a voz aos convidados, num debate que se revelou bastante interessante, abordando-se a importância de dar maior relevância à temática do ambiente na comunicação social – que sofre do que alguns consideraram como censura, além de ser uma temática que é bastante esquecida por alguns políticos –, bem como o facto de os professores universitários deterem grande responsabilidade perante a sociedade, neste como noutros assuntos.

O segundo painel foi inaugurado por Nuno Pimentel, que referiu que a Terra tem sofrido grandes alterações ao longo do tempo e que vai recuperar do que lhe estamos a fazer que “só é uma catástrofe do ponto de vista humano”. De seguida, Maria João Alcoforado mencionou que com as alterações climáticas não só vai haver perda de espécies, como também podem surgir novas, e salientou que deviam haver mais espaços verdes nas cidades. Por último, Cristina Branquinho terminou o seu discurso sobre biodiversidade com a frase “Olhar para a diversidade é olhar para a qualidade ambiental.”

Desta vez houve também bastante participação por parte dos convidados, tendo sido sugerido o estabelecimento de um índice aceitável para a biodiversidade. Foi ainda feita referência à legislação, considerada como positiva, embora seja de salientar que o que falha é a fiscalização.

Após um almoço “biodiverso”, assistimos à conferência de imprensa que contou com a participação de António Nóvoa (Reitor da Universidade de Lisboa), Margarida Santos-Reis (Centro de Biologia Ambiental), Fernando Andresen Guimarães (Presidente da Comissão Nacional da UNESCO), Maria das Dores Meira (Presidente da Câmara Municipal de Setúbal), Alfredo Monteiro (Presidente da Associação dos Municípios da Região de Setúbal), Miguel Galante (Adjunto do Secretário de Estado das Florestas e Desenvolvimento Rural).

São de salientar as palavras de Miguel Galante, que referiu que, “apenas 44% da população portuguesa tem conhecimento da quantidade de patrimónios naturais existentes no nosso país”, afirmando ainda que “A sociedade está a evoluir desde a sua infância, temos de dar tempo ao tempo. O Ministério da Agricultura vai apoiar o voluntariado jovem e dar formação.”

Foi uma intervenção bastante interessante em que foram abordados assuntos pouco conhecidos, como a candidatura da Serra da Arrábida a património natural da UNESCO. Terminada a conferência de Imprensa, aproveitámos a oportunidade para colocar algumas perguntas aos convidados.

comboio_biodiversidade_02Começámos por entrevistar Maria Manuela Sim-Sim, docente na FCUL, que considerou este evento como importante, afirmando também que tem de haver uma divulgação posterior à comunidade. Em relação à comunidade escolar, disse ainda que os alunos no geral interessam-se por questões ambientais, e que há bastante divulgação na faculdade.

De seguida, Francisco Ferreira, vice-presidente da Quercus, disse-nos que a maioria das pessoas ainda não sabe que estamos no Ano Internacional da Biodiversidade. Relativamente à comunicação, não acha que haja alguma censura e afirma que têm de ser as universidades e organizações a ter iniciativas e divulgá-las. Considerou ainda “uma tristeza” ter que se dividir a Arrábida para concorrer a Património da Humanidade por causa da fábrica de cimento Secil.

Entrevista a Luísa Schmidt:

[JRA]: Quais os projectos desenvolvidos em Portugal que considera como mais significativos para a implementação da Década das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável? E considera que os princípios e recomendações desta são os mais adequados?
[L.S.]: Acho que o projecto Jovens Repórteres para o Ambiente, é um projecto muito interessante, deve ser apoiado porque leva os jovens pré-adultos a olhar para aquilo que os rodeia e a perceberem o que está mal ou o que está bem no seu espaço de enquadramento, na sua paisagem próxima.
O projecto Eco-Escolas também é muito interessante, mas há outros como o projecto City Deco, em que os estudantes levam o medidor das partículas consigo todo o dia e depois têm também um GPS, e conforme o sítio por onde vão andando vão registando a poluição de partículas a que estão sujeitos, e assim conseguem perceber quais são os lugares mais poluídos ou menos poluídos e isto até deveria dar para uma base de dados para o país, devia ser mais útil para a sociedade!

Entrevista a João Ferrão:

([JRA]: De que forma é que o planeamento e ordenamento do território têm contribuído para a conservação da biodiversidade?
[J.F.]: O ordenamento do território tem instrumentos de vários tipos, basicamente, planos. Planos a nível nacional, planos regionais, planos municipais, entre outros.
Nos últimos anos estes planos têm vindo cada vez mais a integrar esta preocupação com a biodiversidade. A luta ou o combate contra a perda da biodiversidade tem instrumentos próprios mas é também muito importante que outros instrumentos mais amplos levem em consideração essa preocupação.
O que o ordenamento faz, basicamente, é regular e definir os usos do solos, daquilo que nós podemos fazer, e portanto é um dos instrumentos importantes para levar em conta aquilo que é a biodiversidade.

Bruno Loureiro e Inês Pascoal